“Nuestro objetivo final es nada menos que lograr la integración del cine latinoamericano. Así de simple, y así de desmesurado”.
Gabriel García Márquez
Presidente (1927-2014)

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  • Fernanda Montenegro: 91 años como la gran dama del audiovisual brasileño
    Por Kenia Sampaio Nunes

    Fernanda Montenegro é uma das atrizes brasileiras mais reconhecidas, com uma carreira que se estende ao longo de 60 anos entre o cinema, o teatro e a televisão. Hoje, no seu 91.º aniversário, celebramos os melhores filmes e novelas mais icónicas que contaram com a participação da atriz e relembramos a sua intervenção política e crítica face ao governo brasileiro por causa dos cortes ao investimento público da cultura, e mais recentemente, à censura que os trabalhadores da indústria cultural têm sofrido no atual governo.

    O início da carreira de Fernanda Montenegro foi marcada pelo trabalho em rádio. Antes de atriz, foi locutora na Rádio MEC, onde rapidamente se juntou às atividades dramatúrgicas do grupo de teatro da rádio – Nuestra Natacha foi a sua grande estreia em palco. A partir daí, foi convidada para  integrar o Teatro Ginástico, onde atores amadores participavam em saraus e variadas peças. Entre 1951 e 1953, participou em mais de 80 peças pela Rádio MEC

    A peça Alegres Canções nas Montanhas, em 1950, foi a sua estreia “oficial” enquanto atriz de teatro. Nela, contracenou com Fernando Torres, com quem se casou três anos mais tarde (e permaneceu até que um enfisema pulmonar o levou em 2008). Foi também nessa altura que foi obrigada a escolher um nome mais ressonante – Arlette, o seu nome verdadeiro, era considerado demasiado trivial para uma atriz. A sua carreira descolou exatamente nessa década, e em 1952 recebia o seu primeiro prémio de Atriz Revelação pela Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Entre 1950 e 2020, o nome de Fernanda Montenegro esteve associado com uma miríade de telenovelas, mais de quarenta filmes, dezenas de peças de teatro, uma fotobiografia e uma autobiografia, Prólogo, Ato, Epílogo, editado pela Companhia das Letras em 2019.

    Teatro, televisão e cinema: três paixões de mãos dadas

    Começou a carreira televisiva em 1951, na extinta TV Tupi (trabalhando na primeira telenovela da emissora), mas 1954 é que ocorreu a viragem na carreira de Fernanda Montenegro. Neste ano, estreava-se como protagonista na novela da RecordTV (hoje Rede Record) ao mesmo tempo que nos palcos de teatro Brasil fora atuava na peça O Canto da Cotovia, de Jean Anouilh. No cinema, teve o seu primeiro papel em Mãos Sangrentas, do argentino Carlos Hugo Christensen. A partir de então, nunca lhe faltou vontade nem trabalho, e a atriz conseguiu estabelecer-se como um dos nomes mais prolíficos e reconhecidos do país. Será difícil destacar individualmente apenas uma atuação, seja no cinema seja em novelas, mas há certamente algumas que ressaltam pela qualidade e por terem conseguido persistir na memória coletiva de um povo que a elege como uma das maiores da sua área.

    De A Muralha a Dono Pedaço

    Fernanda Montenegro mantém-se como uma das maiores atrizes de telenovelas e mini-séries brasileiras. Apesar do seu trabalho polivalente, é neste género televisivo que a associamos com mais facilidade. Quem poderá esquecer-se de Bete Gouveia, o eixo fulcral de toda a trama da telenovela Passione (emitida em Portugal pela SIC), ou do beijo entre Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg na novela Babilónia, que suscitou uma nota de repúdio por parte do deputado João Campos de Araújo (Frente Parlamentar Evangélica) e o boicote da telenovela por parte da comunidade evangélica brasileira.

    Mas a verdade é que Fernanda Montenegro há muito que brilha no pequeno ecrã: a década de 1980 foi um furacão na carreira televisiva de Montenegro, especialmente com a estreia da novela Brilhante, de Gilberto Braga, onde protagonizava a riquíssima Chica Newman e contracenou com Vera Fischer, Tarcísio Meira e Dennis Carvalho.

    A sua mais recente participação no mundo das telenovelas foi na famosíssima A Dona do Pedaço, emitida pela SIC no ano passado, onde interpretou Dulce, a calculista mas amorosa avó de uma das protagonistas (Juliana Paes).

    Central do Brasil: o reconhecimento internacional

    Em 1998, estreava o filme que viria a por o nome de Fernanda Montenegro debaixo dos holofotes internacionais. Central do Brasil, de Walter Salles, retrata a relação entre Dora, uma professora azeda cujo ganha-pão é transcrever cartas que pessoas analfabetas lhe ditam. Muitas vezes, Dora deita as cartas fora e não as envia, até conhecer Josué (e brevemente a sua mãe, Ana), cujo desejo é enviar uma carta ao pai que nunca conheceu. Dora e Josué embarcam juntos numa aventura ternurenta e emocionante para encontrar o parente perdido do rapaz, construindo uma amizade belíssima.

    Foi com este filme que Fernanda Montenegro conquistou o público internacional — foi nomeada para o Óscar de Melhor Atriz, que perdeu para Gwenyth Paltrow (Shakespeare in Love) e para um Globo de Ouro na categoria de Melhor Atriz num Filme Dramático. Ganhou, efetivamente, o Urso de Prata de Melhor Atriz na Berlinale 1999 e Melhor Atriz nos seguintes prémios e festivais: New York Film Critics Circle Awards, Troféu APCA, National Board of Review, Festival de Cinema de Havana e International Film Festival Fort Lauderdale.

    Com Doce de Mãe, levou para casa o Emmy Internacional de Melhor Atriz, um dos mais importantes prémios da sua vida, que suscitou felicitações de vários nomes importantes do país, incluindo de Dilma Roussef. Ao longo da carreira, Fernanda Montenegro somou, até agora, 91 prémios e 118 nomeações, entre o cinema, a televisão e o teatro.

    Ação Política

    A atriz sempre foi ativa na sua crítica ao governo e às políticas restritivas do mesmo à produção e indústria cultural. Em 1985 foi convidada pelo então Presidente José Sarney para integrar o Ministério da Cultura, algo que, apesar de todo o apoio pela elite cultural, recusou por não querer abandonar a carreira artística. Em 1999, o Presidente Fernando Henrique Cardoso atribuiu-lhe a Ordem Nacional do Mérito Grã-Cruz, reconhecendo a importância do seu trabalho nas artes cénicas.

    Mais recentemente, tornou vocal o seu descontentamento face ao atual governo de Jair Bolsonaro e a sua direção à base de censura promovida pela Ancine (Agência Nacional do Cinema) que, inclusivamente, retirou cartazes de vários títulos incontornáveis brasileiros das suas paredes.

    “Se eles pudessem, estaríamos todos num paredão e eles atirando em nós com metralhadoras”, declarou à Revista Quem. Adicionou, ainda, que “é difícil. Sem cultura não há educação e sem educação não há cultura. Eu não entendo o que está acontecendo com este país, com tantos xingamentos. Não há explicação. É uma nova moralidade que condena qualquer estrutura contrária ao seu Deus”, comparando o fanatismo e a ingerência do país com o período da ditadura militar brasileira que perdurou até 1985.

    “Não há um filme na minha vida em que eu não esteja em estado de protesto. É uma batalha. E a gente vai vencer. Já saímos de guerras piores. Artista? Sobrevive sempre.”

    A Vida Invisível, filme realizado por Karim Aïnouz teve a sua exibição para os funcionários da Ancine proíbida, suscitando uma exibição de protesto.

    Um dos momentos mais icónicos da sua crítica assumida ao Governo Bolsonaro foi quando apareceu vestida de uma bruxa prestes a ser queimada na capa da revista 451 da Folha de São Paulo. “Prefiro entrar para a história do lado das bruxas”.



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